CRÔNICA: HERÁCLITO E A FELICIDADE

Na Grécia antiga, em Éfeso, encontramos um filósofo chamado Heráclito (535 a.C. – 475 a.C.), que tinha como uma de suas proposições a harmonia dos contrários: precisamos passar fome para mensurar corretamente o valor de uma refeição, precisamos passar sede para entendermos quão essencial é a água, e que também, precisamos de intempéries para valorizar a felicidade. Mais tarde, Aristóteles resumiu essas ideias e lançou sua conclusão: felicidade é um momento que daríamos tudo para que não acabasse. Mas, unindo os pensamentos dos dois filósofos, agora entendemos que, por mais que não queiramos que esses momentos acabem eles terminam para que valorizemos os vindouros. Talvez não tenha essa intenção, mas o faz com maestria.

Outra proposição de Heráclito, é de que um ser humano nunca repete as mesmas coisas: nunca pisa em mesmos solos, e; por consequência, nunca permanece o mesmo. Parece absurdo, mas não é. Ao repetirmos uma ação (exemplo: escrever três vezes o nome próprio), não iremos executá-la igualmente, em totalidade. O conteúdo escrito pode ser igual, mas o jeito de escrever e as letras jamais serão idênticas umas as outras. Ao pisarmos no solo, jamais pisaremos nas mesmas terras, pelo fato de que há vento e chuva; manifesto da natureza em prol da renovação. Quando entramos em um rio, lago, ou mar, saímos e entramos de novo, não estaremos nas mesmas águas. E o ser humano não permanece o mesmo por dois motivos simples: renovação biológica (cabelo cresce, pêlos crescem, seios crescem, aumentamos nossa estatura, nossa pele se renova) e a renovação psicológica (adquirimos novas experiências, novos amores, desejos, passamos a gostar de algumas coisas e deixar de gostar de outras, etc.). E o que isso tem a ver com felicidade? Ao aceitarmos que as mudanças são inerentes à vida, que nada permanece do jeito que se encontra é um grande passo a mudança de paradigmas. Felicidade e mudança são duas palavras diferentes mas que vivem juntas.

Os infortúnios da vida são como a vivência passada (nos construíram ou ainda nos constroem), e também, como as vivências futuras (nos reconstruirão a partir do que somos no momento). Eles fazem parte da nossa biografia. E biografias que só contam felicidades soam falsas, forjadas, não obstante; enfadam-nos por falta de emoção. O indivíduo só é completo quando passa por mais uma de fenômeno, um antônimo ao outro: jamais saberá o prazer de comer e analisará com calma a textura do alimento se nunca passou fome em sua vida, nem que seja por alguns minutos. Jamais saberá a sensação refrescante e aliviadora de beber um copo de água depois de um período de sede. E também, por mais doloroso que seja, jamais saberá o valor de um amor e quão efêmero pode ser se não cuidado, se não sofrer alguma decepção. Todos esses sentimentos nos ajudam a crescer. Saber lidar com a dor e transformá-la num fenômeno positivo, por mais estranho que o seja no momento em que você estiver passando, vai lhe apresentar um novo você, um novo eu, mais forte e mais experiente. Grandes tempestades são o prelúdio de lindas calmarias. Uma precisa da outra pra acontecer e ter sua proporção ideal. De falsidade, já chega o que fingimos ser e não somos, todos dias. Seria uma afronta ideológica de cunho malicioso retirar dados de nossa história de vida. Que nós aproveitemos cada momento.

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