CONTO: ROBIN HOOD

Juquinha, como havia sido carinhosamente apelidado pelo avô, adorava ler e se imaginar
naquelas aventuras incríveis que os escritores criavam. Antes mesmo de aprender a ler, seu
avô lhe contara a história do Robin Hood, um jovem que cansado das injustiças do reino,
roubava dos ricos para dar aos pobres. 
Morador da favela, em um barraco ocupado pelo pai, após este perder o emprego depois do
início desse novo governo, ele sonhava com a aparição desse herói que o impediria de vender
bala no sinaleiro, trazendo comida para aquela comunidade tão sofrida, roubada dos políticos
que ele via na televisão, sempre de terno e bem vestidos. Em contraste com os trapos que ele
e a família tinham. Seu avô por sua vez, talvez para colocar um pouco de esperanças na
cabecinha inocente do neto, talvez por delírio causado pela fome, garantia ao garoto que a
história era real, e que ele mesmo já havia conhecido o herói. Juquinha não acreditava no avô.
Sua inocência havia sido perdida no dia que levou uns tapas de um policial
por estar vendendo balas em um lugar “chique” demais, segundo o próprio militar. Ele queria
ser o Robin Hood. 
Foi em um dia quente de dezembro que ele resolveu, no auge dos seus onze anos, fazer
justiça com as próprias mãos. Ele chegou em casa exausto depois de um dia escaldante de
trabalho na rua e encontrou a mãe sentada no chão do barraco, com as duas mãos sobre o
rosto, chorando. Quando a indagou, ela se limitou a responder: – “Seu pai foi preso” “Por que?
O que ele fez?” O garoto perguntou assustado. O que a mãe respondeu fez crescer em seu
coração o fogo da justiça: “ele é pobre e preto, filho” e continuou chorando. O garoto a abraçou
e em seu íntimo prometeu que agora sem o pai, seria ele que traria o sustento para casa. Se
ao menos o avô ainda estivesse vivo, com certeza saberia melhor o que fazer, mas havia
sucumbido à pandemia, que mesmo depois de anos, ainda fazia vítimas nas regiões mais
pobres do país. 
No dia seguinte, antes mesmo da mãe acordar, ele se levantou, pegou o estilingue – única
lembrança que possuía do avô falecido – se vestiu com o que tinha de mais cinza e preto e saiu
para roubar dos ricos e fazer a alegria da sua comunidade. Se não conseguisse, pelo menos da
sua sofrida mãe. Entrou escondido em um ônibus, e foi para o bairro mais rico da cidade,
aquele mesmo que o policial não lhe deixou trabalhar e ainda o bateu. Era questão de honra
que aquele fosse o lugar. Ele era esperto, já havia lido muitos livros de ladrões e sabia
exatamente que fazer. Aguardou em frente a uma casa bonita até que o homem saísse pra
trabalhar. Quando isso aconteceu, tocou a campainha. Uma mulher vestida com um roupão e
cara sonolenta abriu a porta, quando sem pensar duas vezes, Juquinha atirou com o estilingue
em sua testa. A mulher caiu no chão, e ele começou rapidamente a pegar o que conseguisse
levar daquela casa. Quando seus bolsos e mochila já estavam cheios, ele se dirigiu à saída e
com a pressa nem reparou se a mulher ainda estava lá. Quando colocou os pés para fora, o
mesmo policial truculento daquele dia, juntamente com mais dois soldados apontavam as
armas para ele. O policial falou: “acabou pivete, dessa vez mexeu com as pessoas erradas. É o
fim pra você” e mandou que ele entrasse na viatura. Juquinha baixou a cabeça e foi. Sabia qual
seria o seu destino, já havia ouvido histórias demais sobre garotos negros pegos pela polícia que
desapareciam. Quando colocou um pé para dentro da viatura ouviu o policial que estava mais
próximo gritar de dor. Quando olhou, viu uma flecha atravessada em seu pescoço. Antes
que pudesse pensar no que fazer, os outros dois policiais também foram abatidos. Foi quando
viu vindo em sua direção, contra o sol, a silhuetas de um homem de chapéu estranho, e um
arco nas costas se aproximar. Quando chegou mais perto ele teve certeza, era ele. O herói que
o avô havia lhe contado as histórias e que garantia ser real. Era Robin Hood. O herói vestido
todo de verde se abaixou em sua frente e falou: “garoto, pega esse saco de dinheiro. É
suficiente para você e sua família viverem bem por um tempo” “mas você tem que prometer
deixar esse trabalho pros profissionais, certo?” Juquinha não conseguiu falar, apensa assentiu
com a cabeça e saiu correndo obedecendo as ordens do seu herói improvável.

6 comentários em “CONTO: ROBIN HOOD

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  1. Gostei bastante desse conto! Não culpo o garoto por querer fazer justiça com as próprias mãos. Meu amigo, você mais uma vez mostrou que arrasa mesmo, parabéns!

    Curtido por 1 pessoa

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