Eu gosto de me lembrar de uma gata rajada que atendia pelo nome de Luna. Luna, como a lua que me preenche de esperança. Luna, sorrateira e sonsa como ela só. Mansa. De tão sonsa, mansa.
Apareceu no meu portão em uma noite iluminada de uma sexta-feira 13, acompanhada por um gato preto. Esse, logo se foi. Ela permaneceu misturada à penumbra, até eu permitir que adentrasse. Indecisa, não sabia se ia ou se vinha. Instalava-se por uma noite e desaparecia por vários dias. Imagino que analisava se era mesmo seguro aportar por aqui.
Tinha olhos cor de âmbar, pelo de veludo metade branco, metade cinza-grafite e garras de felina, que bem sabia mostrar quando necessário. Acho que sua vida mundana afiou-lhe as unhas e ensinou-lhe a utilizá-las nas horas em que precisava se empoderar. Nessas horas, não era mansa, nem sonsa.
Após um mês nesse vai e vem, nesse fica, não fica, Luna resolveu me pertencer. Adotou o telhado como morada por algumas semanas, até sucumbir às delícias da cama listrada de lilás e verde com a qual lhe presenteei. Um potinho de ração sabor atum, outro de água fresca e mais um que abrigava o leitinho da noite cativaram seu estômago.
A gatinha estava, pois, devidamente adotada e batizada. Tinha até apelido: Lu. Ganhou um lar e me deu um também. Por sua causa, minha vida mudou. Não me sentia mais sozinha. Havia alguém para conversar durante as noites sem fim. Alguém que me escutava e me ouvia. Acompanhava as palavras com o meneio da cabeça como se compreendesse. Na verdade, compreendia.
Uma conexão se formou entre nós. Seu miau não era como o dos outros bichanos. Diferentes significados de acordo com o tom e a intensidade. Acalentava-me. Fazia-me adormecer com uma suavidade intocável. Às vezes, balançava-me e fazia-me sacudir a poeira. Viveu comigo por oito anos, até o dia em que adormeceu e não despertou. Virou uma estrela. Sua marca permanece em mim. Deixou pelos entranhados na minha pele que me aquecem e um ronronar que nina meus sonhos. Ensinou-me sobre um gostar além de mim. Não me sinto mais só. Uma luz bem brilhante pisca no firmamento e é minha companheira. Toca-me a alma.
Creio que os animais têm o propósito de invadir nossas vidas e irradiar a energia de que precisamos. Eu também tenho um propósito. No dia em que ele se der por encerrado irei encontrá-la. Brilharemos juntas lado a lado no céu negro recheado de pingos prateados.
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